O Senado retirou da pauta de votação a Medida Provisória (MPV) 927/2020, que altera as regras trabalhistas durante o período da pandemia. O texto irá caducar, tendo em vista que o prazo de vigência da proposição expira no próximo dia 19 (domingo). A retirada de pauta atende a manifestações do movimento sindical, que solicitaram aos parlamentares que votassem contra ou a deixassem caducar.
Já em 31 de março, a Fepesp alertava "O governo aproveita o estado de calamidade pública decretado para o combate à contaminação pelo coronavírus para dar um refresco às empresas, à custa de pisotear leis do trabalho e fragilizar quem trabalha para sobreviver" (veja aqui: https://bit.ly/2WUhvqF).
A primeiro chega-prá-lá se deu logo após a edição da medida provisória, em um domingo à noite, no dia 22 de março: na mensagem original, o governo autorizava desemprego à vontade, permitindo a demissão sumária por quatro meses, durante a emergência da pandemia, para ajudar as empresas. Mas que ajuda seria essa? Sem emprego, sem salário, como fazer andar a economia? O governo deu uma volta, editou em seguida uma nova medida provisória (a MP 928), eliminando a carta branca à demissão da MP original.
Nota da Contee, de 1º de junho, deplorava que a medida editada em março pelo Governo Bolsonaro, piorada pela base governista na Câmara dos Deputados, autorizava trabalho aos domingos, a critério do empregador, e o trabalho bancário aos sábados; criava a prejudicial figura de transição extrajudicial de direitos trabalhistas, por meio cartorário; alterava a forma de correção de débitos trabalhistas, favorecendo às empresas lesarem seus empregados; afrouxava a fiscalização dos auditores fiscais, implantando a chamada dupla visita (a lavratura de auto de infração só é permitida na segunda fiscalização); “dentre outras medidas lesivas ao direito do trabalho, já tão fragilizado”.
Medida perversa - A presidenta da Associação Juízes para a Democracia, Valdete Severo, considerava essa MP “uma declaração de guerra à classe trabalhadora. Não tem salvação para nenhum dos artigos.” O vice-presidente da Comissão Nacional de Direitos Sociais do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marthius Sávio Cavalcante Lobato, a qualificou como “uma medida provisória perversa”.
As centrais sindicais também pressionaram pela caducidade da medida. Para o secretário de Assuntos Jurídicos da CUT, Valeir Ertle, ela era “inconstitucional, privilegia os maus pagadores e vai fazer o trabalhador passar fome. É uma crueldade”. O primeiro-secretário da Força Sindical, Sérgio Luiz Leite, denunciou que a 927 simplesmente “aproveita a crise sanitária para aprofundar a reforma trabalhista do governo anterior”. “Não tem o que discutir nessa medida”, reforçou Alexandre Caso, da Intersindical. O secretário-geral da CSB, Álvaro Egea, considerava o projeto um “lixo legislativo”. O diretor da CTB Nivaldo Santana afirmou que a 927 podia “criar o caos, porque protege o patrimônio dos mais ricos e não faz nada para proteger quem vive do trabalho e, pior ainda, os que estão sem emprego, trabalho precário ou moram nas ruas”.
Fora de pauta - Nesta quarta-feira, 15/07, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP) retirou a MP 927 de pauta. Na semana passada, a falta de entendimento já havia impedido a votação da proposição pelos senadores, tendo em vista a polêmica gerada pelos dispositivos do Projeto de Lei de Conversão (PLV) 18/2020, resultante da MP, que recebeu mais de mil emendas no Senado. “Quando não se tem entendimento é praticamente impossível votar MP ou uma matéria com a complexidade dessas”, afirmou o presidente da Casa.
O líder do governo, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) admitiu que faltou argumento por parte da própria liderança do governo para convencer os senadores sobre a votação da MP. Ameaçou, porém, que o governo poderá “buscar soluções” para o que não foi deliberado.
Eliziane Gama (Cidadania-MA) observou que a MP contém mudanças profundas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e retira direitos trabalhistas. Ela ressaltou que o texto aprovado na Câmara prevê a dispensa de realização de exames demissionais, e também a devolução de remuneração de férias por parte dos empregados quando não houver completado o período aquisitivo ou em caso de demissão.
Randolfe Rodrigues (Rede-AP) observou que todos os partidos de oposição apresentaram destaques ao texto a ser votado. Eduardo Braga (MDB-AM) ressaltou que não se sentia tranquilo para adentrar no mérito da proposição, que estabelece a prevalência do acordo individual sobre a questão coletiva, o parcelamento do salário educação e da previdência, entre outros pontos.
Paulo Paim (PT-RS) criticou o projeto por estabelecer o parcelamento de débito trabalhista em cinco anos, a prorrogação da jornada para profissionais da saúde e a adoção de banco de horas que pode ultrapassar o período da pandemia e chegar a 18 meses. Otto Alencar (PSD-BA) disse que muitos setores da indústria avaliaram a possibilidade de aumento do desemprego com a aprovação da proposta.
Não retroage - É importante lembrar que, quando govera por medida provisória, o governo tem carta branca para fazer suas maldades por um tempo determinado, pelo menos. Para serem aprovadas e entrar em vigor de forma efetiva, as medidas provisórias devem ser votadas pelo Congresso em no máximo 120 dias (prazo inicial de 60 dias que pode ser prorrogado por outros 60 dias). Se ao final desse prazo não houver entendimento e a medida não for votada, ela perde sua validade. Mas não tem volta: as providências que foram aplicadas durante o período de vigência precária, antes da votação ou da MP caducar, valem durante esse período provisório.
Com informações da Rede Brasil Atual, Contee, Agência Senado
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