Depois de montada uma estrutura de guerra no CNE e nas Secretarias do MEC, somos informados que o novo ministro quer um “pacto”. Não cola.
Soa mais como uma tática do governo para consolidar as maldades já feitas e ganhar tempo para planejar novas. Ou não teríamos tido, ainda ontem, as nomeações que tivemos para o Conselho Nacional de Educação.
Ministros, no governo Bolsonaro, não têm autonomia para pactos. Se o governo queria fazer um pacto, por que não deixou o próprio ministro negociar e conduzir, ele mesmo, as nomeações? Por que foram feitas antes e unilateralmente? Por que, ao invés de aproximar, consolidaram o afastamento das entidades representativas da educação (o que já vinha acontecendo neste ano e meio de governo) e, agora, alcançam até mesmo as entidades representativas dos entes federativos no setor – Consed e Undime – que sempre estiveram à disposição para pactos? Pacto em nome de quê?
As novas nomeações poderiam ter representado o início de um pacto com toda a área da Educação e não a consolidação da mesma política e atores da gestão Weintraub/Vélez nas estruturas do MEC.
Foi em uma reunião ministerial que Paulo Guedes revelou a estratégia deste governo para lidar com aqueles que ele considera seus inimigos:
“Então, nós sabemos e é nessa confusão toda, todo mundo está achando que estão distraídos, abraçaram a gente, enrolaram com a gente. Nós já botamos a granada no bolso do inimigo.”
É a imagem perfeita para as nomeações do dia de ontem no MEC – se examinamos conjuntamente a nomeação do Ministro e as nomeações no Conselho Nacional de Educação.
Os dois acontecimentos se misturaram numa “confusão toda” durante o dia de ontem. Ao final do dia, veio a nomeação do Ministro Pastor Milton Ribeiro com um plano de priorizar a educação básica através de um grande pacto nacional que una a todos – este é o abraço. Mas, momentos antes eram divulgadas as nomeações do Conselho Nacional de Educação – estas são a granada, colocada preventivamente no bolso dos inimigos.
Por um lado, implodiu-se a Câmara de Educação básica com uma mudança que dá o comando dela a um verdadeiro “gabinete do ódio educacional” e, simultaneamente, aparece um Ministro Pastor pregando a união nacional em torno da educação.
As aparentes boas intenções do Ministro não coadunam nem com a estrutura já existente dentro do MEC – com as Secretarias em poder da militância ideológica – e, também, não coadunam com as nomeações no CNE, que colocam a Câmara nas mãos dos grupos ideológicos radicais de suporte ao presidente – uma granada com olavistas, evangélicos e militares – e que retiram do CNE representantes de entidades educacionais e dos sistemas.
Se a estratégia colar, corremos o risco de ter uma fila de incautos na porta do MEC para participar do tal “pacto pela educação” – uma reedição, aliás, de algo que já não deu certo no passado. Sairão todos de lá com uma granada no bolso também.
Militares não foram treinados para dialogar, mas para fazer a guerra; pastores foram treinados para evangelizar – segundo “sua” interpretação do evangelho; e olavistas para destruir o “establishment”, ou seja, as instituições da frágil democracia liberal. Que pacto pode ser construído com tais forças políticas? Em nome de qual “qualidade” para a educação, para a formação da juventude?
A versão de Guedes, se preferirem, poderá ser substituída por uma versão mais elegante, se desejarem, formulada há quatro anos pelo próprio Reverendo Milton Ribeiro, agora ministro:
“A correção é necessária para a cura”, disse o pastor. “Não vai ser obtido por meios justos e métodos suaves. Talvez uma porcentagem muito pequena de criança, precoce e superdotada, é que vai entender o seu argumento. Deve haver rigor, severidade. E vou dar um passo a mais, talvez algumas mães até fiquem com raiva de mim: deve sentir dor.”
Leia aqui.
Assim também se expressava Herbert Spencer em “The man versus the State”, no século XIX, quando esclarecia a relação entre o sofrimento e a evolução da humanidade:
“A humanidade está sendo pressionada pelas inexoráveis necessidades de sua nova posição – está sendo moldada em harmonia com elas, e tem que suportar a infelicidade resultante da melhor forma possível. O processo deve ser vivido, e os sofrimentos devem ser suportados.”
Boa sorte aos que resolverem fazer um pacto “pelo bem da educação brasileira” e caminhar sobre o terreno minado do MEC. Mas cuidado, a “vara da disciplina” pode estar atrás da porta.
Luiz Carlos de Freitas é professor aposentado da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP. Publicado originalmente no Blog do Freitas, aqui.
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