A entrevista da empresária Viviane Senna, no jornal Folha de S. Paulo desta quarta, 16/09 (“Está claro que a reabertura das escolas não agrava a pandemia”, página B3, aqui) está repleta de ingenuidades, inverdades, e mesmo falácias sobre assunto que merece ser tratado com maior seriedade.
Como psicóloga, demonstra que pouco entende de epidemiologia. No parecer de equipe qualificada na questão verificou-se que 64,4% das crianças e adolescentes carregam o vírus e são assintomáticas, conforme indicado pelo inquérito sorológico conduzido por técnicos da Prefeitura de São Paulo. Ao afirmar ser pequeno o número de crianças infectadas pelo Covid-19 no mundo, esquece que, mesmo assintomáticas, crianças transportam vírus para suas casas, potencialmente contaminando pais, amigos, vizinhos, colegas e até desconhecidos no transporte coletivo superlotado.
A entrevistada mostra também desconhecer, de forma ingênua, a realidade social da escola pública: ao ironizar sobre os ‘campeões da educação’, deveria lembrar-se de que o Brasil e seus vizinhos são também os campões da desigualdade social. Como comparar protocolos de retorno às aulas elaborados por um pequeno conjunto de escolas de elite com as condições limitadas de outras três mil pequenas escolas particulares que compõem a rede privada de ensino na cidade de São Paulo?
A palavra mágica para a diminuição da exposição de escolares ao perigo da contaminação nas escolas parece ser o ‘rodízio’ de presença, com alunos comparecendo à escola, mediante permissão dos pais, apenas em alguns dias. Mas, os educadores, nunca chamados a opinar, terão que comparecer compulsoriamente todos os dias, em contato direto com crianças que, mesmo assintomáticas, poderão passar adiante o vírus mortal. O ‘rodízio’ proposto também expõe outro falso argumento a favor da volta apressada às aulas: o da necessidade premente de pais que precisam se apresentar ao trabalho e, para isso, necessitam deixar filhos sob a guarda da escola. E nos dias em que a criança não puder ir à Escola? Com quem ficarão? O raciocínio não fecha.
Finalmente, temos por parte da ‘especialista’ como a qualifica a Folha, a opinião genérica e perigosa de que “a gente pode abrir restaurante, shopping, 25 de Março, bar, salão de beleza, tudo antes das escolas” – ora, restaurante, lojas e salões são frequentados por quem quiser, mas o educador será obrigado a estar presente nas Escolas, acolher os alunos presencialmente e, ainda preparar material e cuidar do aprendizado remoto daqueles que permanecerem em casa, por opção ou por “não estarem escalados”.
O exemplo internacional ainda é boa referência para nós. Noticiário recente dá conta de que, na França, mais de oitenta escolas que retornaram às aulas presenciais foram fechadas nos últimos 15 dias por casos de covid-19. Parece um número pequeno, levando em conta que há 60 mil escolas naquele país. Mas vejam só: somente no Estado de São Paulo, com 11 mil escolas privadas, foram registradas mais mortes (32.900 desde março) do que na França toda (31 mil), que registrou oito mil novos casos de contaminação apenas no último final de semana. Para manter a proporcionalidade com a França, a reabertura de escolas agora, em São Paulo, poderia provocar aqui um acréscimo de até 80 mil casos de contaminação, provocando o fechamento de 800 escolas irresponsavelmente reabertas.
Não é o que queremos para o nosso povo. Como diz com grande sensibilidade a jurista e escritora Andréa Pacha, em manifestação nesta quarta, “infelizmente não tivemos paz, nem política responsável para enfrentar essa pandemia.” Não podemos fraquejar.
Celso Napolitano é presidente da Federação dos Professores do Estado de São Paulo
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